Luiz Fernando Veríssimo starts his Sunday article by mentioning Lolita
and how Nabokov felt inspired
after reading about an artistic ape drawings of his
cage. He quotes a sentence from "Speak, Memory" ( "Nabokov said that
he inhabits 'a zoo of words'.").
For Veríssimo "like the the gorilla, Lolita's narrator writes about
his limitations. His real subject is language."
If Humbert Humbert parodies American vulgarity, as it's perceived
through the lenses of a European intellectual, he also parodies
the European intellectual, lost and ridiculed in the New World, who
depreciates himself because of his cultural imposture
and guilt.
HH's stylistic paraphernalia serves him as a means to
justify an uncommon passion and for nothing else.
VERISSIMO - Entre grades - O Estado de S.Paulo - 30/01/11
"O Vladimir
Nabokov certa vez deu uma curiosa explicação sobre a origem do seu romance
Lolita. Disse que sua inspiração fora a notícia que lera em algum lugar sobre
uma experiência feita num jardim zoológico em que ensinaram um gorila a
desenhar, e o primeiro desenho feito pelo gorila foi das barras da sua jaula.
*** Se Nabokov não estava deliberadamente tentando enlouquecer um entrevistador
- afinal, o que o gorila entre grades tem a ver com a história da paixão de um
homem mais velho por uma menina de 12 anos, e seu trágico desfecho? - sua
resposta pode ter vários significados. Um deles é o confinamento dentro do
próprio texto que é a sina de todo autor, mais evidente no caso do narrador de
Lolita, um prisioneiro do seu estilo tanto quanto da sua obsessão por ninfetas.
Como o gorila artista dentro da sua jaula, o narrador escreve sobre os seus
limites. O seu verdadeiro assunto é a linguagem. *** Humbert Humbert, o
narrador de Lolita, escreve em vários níveis de paródia. Parodia a
vulgaridade americana do ponto de vista de um intelectual europeu mas também faz
uma a paródia do intelectual europeu deslocado e ridicularizado no Novo Mundo,
em que o autodesprezo pela sua impostura cultural se mistura com a culpa.
Mas ele não pode se livrar nem do seu pedantismo nem da sua obsessão. Lolita
está cheio de jogos de palavras, imagens preciosistas, símbolos obscuros,
referências literárias - toda a parafernália da ostentação intelectual
mobilizada para um só fim, o de justificar uma paixão incomum. Tanto o gorila
quanto o Humbert Humbert descrevem o que os separa do mundo. *** No livro A
Última Tentação de Cristo de Kazantzakis há um diálogo em que um personagem diz
a outro que seus olhos não entendem a mensagem de um profeta porque não veem
nada além das palavras. "Mas o que as palavras podem dizer? Elas são as não veem
nada além das palavras. "Mas o que as palavras podem dizer? Elas são as grades
negras de uma prisão onde o espírito grita para ser ouvido." No seu livro
Speak, Memory (Fala, memória) o próprio Nabokov diz que está "cativo
num zoo de palavras". A ideia das palavras como grades que impedem a
expressão do espírito ou como uma insatisfatória seleção sem alternativas de
animais atrás das cercas de um zoo deve ter ocorrido a muitos autores. Em toda a
fascinante literatura da Clarice Lispector, por exemplo, se repete este choque
com o limite da linguagem, esta incapacidade angustiante de dizer o indizível,
de ultrapassar as grades. O que se quer dizer está sempre lá fora, além das
palavras. *** "A glória de Deus é encobrir, mas a glória dos reis é tudo
investigar", disse Salomão (Provérbios 25:2). Substitua-se "reis" por
escritores e artistas e sua busca de glória pela investigação de toda a
experiência humana e seus mistérios, e chegamos ao Nabokov e seu gorila. Nunca
ultrapassaremos as grades. Podemos no máximo sacudi-las com mais ou menos
talento ou vigor, mas resignados à ideia de que a verdadeira glória de Deus
começa onde termina a linguagem. Pois se trata de um Deus ciumento, senhor de
todas as nossas paixões, e indisposto a compartilhar sua glória, ou sua
literatura, com quem quer que seja. Mesmo o Nabokov ou a Clarice.
VERISSIMO
- O Estado de S.Paulo