25 de julho de 2010 | 0h
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excerpts: "Franz Kafka
escreveu no seu diário que nunca tinha amado a sua mãe como ela merecia por
causa da língua alemã. 'A mãe judia não é uma 'mutter', escreveu ele. ...Kafka
escrevia em alemão. A língua do seu cotidiano era o checo. A língua da sua mãe
era o iídiche. Além de tudo o mais que representa para a literatura moderna,
Kafka foi o primeiro a falar do estranhamento com a língua materna, que no fim é
um estranhamento com toda linguagem, que acomete quem a abandona. Escritores
escrevendo na língua que não era a da sua casa foi uma constante do século. Foi
Kafka quem, no século dos exílios, definiu uma das suas formas: o exílio em
outra língua. Na qual ninguém se sentia em casa com sua "mutter" e talvez por
isso tenham criado o que criaram... O primeiro notável a abandonar sua língua
materna e adotar, e dominar totalmente, outra foi Joseph Conrad, o polonês que
acabou como um dos grandes estilistas do idioma inglês. Muito depois, o exemplo
mais notório desta migração foi o russo Vladimir Nabokov...Nabokov também é o
melhor exemplo do estranhamento citado por Kafka e das suas consequências
literárias. Talvez nenhum outro escritor do século tenha usado a linguagem com a
sua destreza e inventividade, frutos do estranhamento. Só quem chega adulto numa
língua estranha vindo de outra pode descobrir todas as suas possibilidades e
brincar com todas as suas peculiaridades, como Nabokov fez com o inglês até
beirar o preciosismo. No seu caso a língua abandonada, a língua da casa, era a
de uma infância idílica na São Petersburgo pré-revolução, cujas lembranças só
alimentavam a mordacidade da sua linguagem no exílio...Samuel Beckett era um
irlandês que escrevia em francês. Como no caso de Nabokov, isso também lhe
possibilitou escrever numa linguagem pura, no sentido de intocada pelas
tradições e pelos vícios acumulados da língua da infância...Para Beckett o
estranhamento só trouxe a angústia da impossibilidade de nos comunicarmos, em
qualquer língua. Jorge Luis Borges transitou por todas as línguas, por todas as
literaturas e por toda a História, sem contar as partes que ele mesmo
inventou. Mas escrevia na língua da sua infância. E depois da cegueira,
quem lia para ele era sua mãe. Borges tinha a língua e a voz maternas com ele,
portanto. O seu não era um exemplo de estranhamento kafkiano. Ou era um
estranhamento que Kafka invejaria."
A very inapt translator, I'll only
offer only a few lines in English:
"Kafka wrote down in his
diary that he didn't love his mother as well as she
deserved because of the German language."A Jewish mother isn't a 'Mutter',
he said. Kafka wrote in German. His everyday language was the Czech. His
mother's tongue was the yiddish... Kafka was the first to speak about
an estrangement of his mother tongue...an estrangement that arrives to
anyone who abandons this language. ...In a century of exiles, it was Kafka who
defined one of its forms: the exile into another language. A language in
which nobody could really feel at home like staying close
to his "mutter"... Nabokov is one of the best examples of the estrangement
mentioned by Kafka and of its literary consequences. In his case the abandoned
language, the home-language actually was his idyllic childhood in
pre-revolutionary St.Petersburg..."