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Livro póstumo e inacabado de Nabokov vira best-seller na Rússia
05 de janeiro de 2010 • 10h01

 
O livro póstumo e inacabado de Vladimir Nabokov "O Original de Laura", que o escritor russo mandou queimar logo antes de morrer em 1977, seu último desejo ignorado pelo filho, se transformou em best-seller na Rússia. "''Laura'' vende muito bem. É um acontecimento literário incomum na Rússia. Estamos falando do livro inacabado de um autor clássico", informou à Agência Efe uma das funcionárias da livraria "Moskvá", no centro da capital russa.

O último livro do famoso autor de "Lolita", uma das obras mais controversas do século XX, está entre os presentes de Natal favoritos para os leitores russos.

"Somos os líderes de vendas em Moscou", apontou a vendedora, que cifrou em milhares os exemplares vendidos só pela internet desde a publicação do livro no início de dezembro.

Na livraria popular Biblio-Globus, o livro de Nabokov, cuja tiragem foi de 50 mil exemplares em versão impressa e outros dez mil manuscritos, é o quarto nas listas de vendas.

A versão impressa em russo custa 229 rublos (R$ 12,99), um preço acessível para o ávido leitor russo, enquanto a versão bilíngue em russo e inglês chega até 649 rublos (R$ 36,82).

No entanto, esses exemplares bilíngues são uma pequena joia literária, já que incluem as cópias fac-símile dos 138 originais, manuscritos a lápis e paginados, nos quais Nabokov escreveu o livro nos últimos anos de sua vida e que guardava em caixas de sapatos.

"Logo após ser publicado, o livro era vendido imediatamente", aponta uma funcionária da livraria Dom Knigi, que assegurou que a demanda quase não diminuiu no decorrer das semanas.

Mais do que um livro, "O Original de Laura" é uma experiência literária única que permite ao leitor conhecer em primeira mão como trabalhava e ordenava ideias geniais a privilegiada mente de um escritor como Nabokov.

"Sempre é interessante saber em que trabalham os escritores nos últimos anos de sua vida e na fase final de sua capacidade criativa", assegurou Tatiana Ponomariova, diretora do museu Nabokov de Moscou.

A publicação do livro decidiu um dilema ético para o filho do autor, Dmitri Nabokov    , que durante anos ficou na dúvida sobre se devia ou não cumprir a última vontade de seu pai.

Precisamente, o livro começa com uma emocionante introdução na qual Dmitri relata os últimos dias de doença de seu pai e explica os motivos da publicação do texto, o que resultou em críticas por parte de editores e escritores.

Foi em 1975, quando o estado de saúde do escritor começou a piorar rapidamente, que Nabokov começou a escrever "esse embrião de obra de arte (...)", assinala seu filho.

Na introdução, o filho lembra que Nabokov também tentou queimar então a minuta de "Lolita", mas que "sua esposa (Vera) lhe arrancou das mãos" no último momento em duas ocasiões.

Quando a doença começou a limitar seus movimentos, "Nabokov teve uma conversa com sua esposa na qual disse categoricamente que se morresse antes de terminar o livro, ele deveria ser queimado", disse Dmitri.

No entanto, a vontade do escritor foi ignorada pela esposa, que conservou os rascunhos em um banco suíço, e por seu filho, que levou 30 anos para decidir pela publicação de seu conteúdo em forma de livro.

"Esses especialistas (os críticos) esquecem que, na realidade, Nabokov não queria queimar ''Laura'' sob qualquer circunstância, mas ansiava escrever tantas páginas quanto fossem necessárias para acabar o rascunho", aponta.

Dmitri, de 76 anos, lembra que Franz Kafka também pediu a Max Brod que queimasse obras como "Metamorfose", "O Castelo" e "O Processo" "consciente de que ele jamais se atreveria a cumprir tal pedido".

"Nabokov agiu da mesma forma ao pedir a destruição do livro a minha mãe", apontou o filho do escritor, que considera que não podia privar o mundo de uma obra literária desse calibre.

Em sua opinião, "O Original de Laura" é uma obra desconexa e inconclusa, mas "genial" e com semelhante "potencial revolucionário" que "Lolita", um dos romances mais influentes da literatura moderna.

"Em minha cabeça já está terminada. Revisei a obra mentalmente umas 50 vezes", disse Nabokov ao "New York Times", um ano antes de morrer, sobre o livro que narra as infidelidades da promíscua Laura e os sofrimentos de seu desventurado marido.

Escritores como o britânico Martin Amis criticaram duramente a decisão, enquanto outros acusaram Dmitri Nabokov     de querer enriquecer com a obra de seu pai.

Outros gênios da literatura como o poeta romano Virgílio e o escritor russo Gogol também pediram, em vão, que suas obras-primas "Eneida" e "Almas Mortas" fossem postas em chamas.

EFE
 
 
 
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